>
>
Comunidades Ciganas: desafios de sempre, estratégias urgentes

Comunidades Ciganas: desafios de sempre, estratégias urgentes

Socióloga, EAPN Portugal

As comunidades ciganas enfrentam dificuldades de inclusão social sobre as quais importa intervir, mobilizando para o efeito ações que combatem as discriminações múltiplas que este grupo tem vivenciado. Neste sentido, o momento é particularmente interessante e relevante pois estamos a definir o próximo Quadro Comunitário de Apoio e esperamos este seja um instrumento importante para suportar e apoiar ações que facilitem a inclusão destas comunidades. Consideramos que a inclusão das comunidades ciganas exige uma responsabilidade de todos e deve ser abordada numa perspetiva sistémica/integrada, colocando em interação todos os agentes (politico, técnicos, comunidades e associações ciganas). Integrada porque deve de existir uma preocupação de olhar para esta problemática tendo em conta as suas várias dimensões e as suas diversas formas de manifestação. Estratégica porque a ação deve ser delineada e pensada de forma a ter efeito, não só ao nível do trabalho desenvolvido pelas várias organizações e atores, mas também ao nível politico e de decisão.

Entendemos igualmente que no combate às situações que as comunidades ciganas vivenciam diariamente e na sua própria inclusão social, devem ser mobilizados um conjunto alargado de atores, onde se devem incluir as próprias comunidades ciganas.

A este nível é necessário criar as condições necessárias para que a participação se realize em igualdade face à restante sociedade, pois viver numa situação de exclusão social significa estar ausente/distante de todos os princípios inerentes ao exercício da cidadania.

Neste sentido, a intervenção deve ir no sentido de lhes restituir estes princípios, criando igualmente condições para o exercício pleno da cidadania.

Ao mesmo tempo é fundamental criar na sociedade uma verdadeira cultura de participação e de solidariedade que seja capaz de reconhecer e compreender estas comunidades e as suas necessidades.

De entre as várias formas de participação aquela que é, porventura, mais importante e, simultaneamente, a que se tem revelado mais difícil de levar à prática e expandir, é o fomento da participação e expressão das comunidades ciganas. Importante, porque:

  • A participação dos cidadãos excluídos na definição das medidas e ações que visam combater a sua situação social e económica e, posteriormente, na sua concretização, corresponde a um direito que lhes assiste e dá garantias de que a sua voz é ouvida e de que os seus reais interesses são salvaguardados.
  •  E porque esta participação garante a mobilização dos que estão mais interessados em que as medidas e ações sejam bem-sucedidas e porque corresponde ao exercício de uma cidadania ativa e traduz uma afirmação da vontade de mudar a sua situação.

A inclusão das comunidades ciganas e o combate à discriminação terá que ser uma peça de um processo em rede mais amplo, que vislumbre a sociedade intercultural como um objetivo a alcançar. Para tal, este processo passará quer pela consciencialização de que a inclusão é da responsabilidade de todos, quer pela nossa capacidade de estabelecermos parcerias de trabalho e um forte trabalho em rede. Não nos parece que haja fórmulas mágicas para o conseguir, mas poderemos ter em conta algumas ações: ser capaz de reconhecer a singularidade de cada pessoa e valorizar as diferentes perspetivas, experiências e contributos; apostar na participação ativa das comunidades ciganas e dos seus representantes (associativismo), quer no momento da realização dos diagnósticos, quer enquanto veículos para a valorização dos aspetos que se pretende promover (testemunhos diretos), quer no acompanhamento e avaliação das ações (empowerment).

A participação das comunidades ciganas deve permitir o exercício de um direito de cidadania e a capacidade real de traduzir os seus interesses e as suas expectativas numa ação coletiva.
 – Promover o associativismo cigano – espaço-chave para a própria sensibilização dos ciganos e a sua promoção social. Tal como outros movimentos sociais, o associativismo cigano está a tentar encontrar formas de gestão, organização e participação coerentes com os princípios que defende. Neste processo é importante ter presente que o associativismo (a par da mediação) é, atualmente, uma das melhores formas de promover a participação social das comunidades ciganas porque i) algumas associações foram as primeiras a dar resposta aos problemas dos ciganos; ii) conseguiu-se desenvolver no interior das comunidades ciganas a consciência das suas próprias necessidades e a capacidade de resolver os problemas, assim como fomentar o seu próprio desenvolvimento
 – A figura do mediador, como figura que conhece a fundo tanto as comunidades ciganas como a envolvente social, deve ser potenciado na intervenção com as comunidades ciganas, no sentido de promover a proximidade e a adequação dos instrumentos/mecanismos utilizados na intervenção.
Cultura de parceria e de trabalho em rede (colaboração interinstitucional)
Construção de novos espaços de participação e de cidadania, que respeitem as diferenças e promovam as condições que permitam às comunidades ciganas desenvolver o seu próprio percurso de inclusão. Verifica-se que alguns elementos das comunidades ciganas protagonizam este processo no sentido de promover uma cultura participativa, sendo possível o reconhecimento da sua identidade cultural com o exercício de uma cidadania ativa, criando frequentemente iniciativas, em conjunto com a sociedade maioritária. Construção de espaços de participação que a partir da sua motivação, implicação e saber-fazer, são o verdadeiro motor de mudança e de transformação desta sociedade.
Envolvimento da sociedade civil – o combate à pobreza e à exclusão social não é apenas da responsabilidade das organizações sociais e dos seus profissionais, mas também da sociedade em geral. Esta perspetiva implica a promoção de uma cidadania ativa, do envolvimento e participação de todos. O funcionamento democrático de sociedade necessita da participação ativa da população em todos os níveis da vida social.

É neste sentido que consideramos que se deve caminhar de forma a promover a inclusão das comunidades ciganas na sociedade, bem como os valores de igualdade, dignidade humana e de cidadania.

Esta inclusão deve assentar numa interlocução próxima com aqueles que vivenciam essas realidades. De outra forma, estaremos sempre a falar do que não sabemos, do que não sentimos e do que não partilhamos.

A sua presença nos espaços de participação, alem de enriquecer os demais com a sua colaboração pessoal e coletiva, é um testemunho de mudança ao nível da igualdade e da justiça social.

A participação constitui um valor em si mesmo, pois estamos perante a co-responsabilização, a partilha e a tomada de decisões em conjunto.

É a base da cultura democrática.

É a condição para a transformação social, permitindo dar resposta aos interesses coletivos, colocando em prática soluções para problemas concretos.
É uma responsabilidade e um compromisso de todos os cidadãos.
Participar significa implicar-se e comprometer-se na tomada de decisões e no desenvolvimento da sociedade. A participação não deve ser confundida apenas com ações ou práticas que se vão desenvolvendo. Deve ser um processo permanente e entendida como algo mais abrangente e profundo.

A participação é um desafio contínuo e exige uma avaliação permanente, pois todos sabemos que a participação não se adquire, nem se mede por um único momento, constrói-se e fortalece-se com o tempo. É urgente mudar e definir um conjunto de ações prioritárias. Não podemos mais ter discursos fundamentados apenas nas vontades individuais das pessoas, não nos cabe a nós dizer que as pessoas não querem participar porque não estão habituadas a participar. É necessário criar oportunidades para que essas pessoas se façam ouvir e colaborem mais ativamente nos seus próprios processos.

Assim, a participação assume-se como um instrumento pertinente no qual se podem formar cidadãos consistentes dos seus direitos e deveres, cidadãos capazes de se assumirem como agentes transformadores de uma sociedade mais justa e igualitária.

Dezembro 12, 2014
Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on email
Share on whatsapp
Campanha
Apoio
Campanha