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Projeto PACT – As pessoas primeiro!

Projeto PACT – As pessoas primeiro!

Licenciado em Trabalho Social, Mestre em Intervenção Social e gestor de Serviços Sociais no Governo Regional de Castela e Leão, Espanha

Podemos melhorar os serviços dirigidos às pessoas em risco de exclusão social? Podemos integrar os serviços que essas pessoas recebem das diferentes instituições, sejam públicas ou privadas? Que impactos positivos obtêm os beneficiários quando diferentes profissionais se comunicam com uma linguagem comum, trocam informação e partilham modelos? Podemos partilhar todo o conhecimento disponível para encontrar ontologías de um fenómeno tão complexo como a exclusão social? De que adaptações precisaria o sistema?

O Projecto PACT (Pro Active Case-based Targeted model) tenta dar resposta a estas e outras perguntas através de uma experiência que se está a levar a cabo na região de Castilla e León (Espanha) e que é cofinanciada pela Comissão Europeia dentro do programa EASI.
A experiência que reportamos quer gerar aprendizagens como resultado da implementação dos princípios do Social Investment Package (SIP) aplicados à intervenção social com pessoas e famílias que se encontrem numa situação de risco de exclusão.
O desafio surgiu em grande medida por meio dos impactos generalizados que a crise económica e financeira teve na população espanhola: aumento desmedido do desemprego, diminuição de vencimentos, elevado endividamento familiar e conseguinte saturação do sistema de serviços sociais que, desde 2010, tem enfrentado um acréscimo exponencial da procura, ao mesmo tempo que surgiram novas formas de exclusão num contexto de contração orçamental.
O Sistema de Serviços Sociais de Responsabilidade Pública de Castilla e León (1) já tinha apostado previamente em duas linhas estratégicas chave para alcançar progressos na inovação social.
Em primeiro lugar, realizou-se uma aposta inequívoca na integração entre a administração regional e os governos locais com concorrências na matéria (nove deputações provinciais e quinze municípios com mais de 20 mil habitantes). A regulamentação juntamente com um catálogo de serviços comuns; a gestão por processos homogéneos em todo o territorio; e um sistema de informação compartilhado entre todas as administrações tem configurado um sistema sólido em condições de avançar.
Em segundo lugar, a trajetória de pacto com os agentes sociais (sindicatos e empresários) e com as entidades não-governamentais dedicadas à ação social, tem colocado ao sistema de serviços sociais em condições de explorar as enormes possibilidades de melhoria que oferece um autêntico trabalho em Rede. Essa segunda abordagem está a ponto de cristalizar numa norma com forçade Lei que vai reconhecer o papel e vai regular as relações entre os agentes.
Neste contexto de actuação aprecia-se um claro alinhamento com o SIP, no que se afirma que os serviços sociais representam um investimento inteligente e sustentável quando se produz a superação das perspectivas meramente assistencialistas e paliativas das situações de necessidade e se adotam enfoques proactivos na sua estratégia, mais capacitantes no seu modelo de atenção e mais adhocráticos na maneira de organizar a atenção votada a cada pessoa no seu curso vital e no momento concreto.

 

Quem constitui o PACT?

Os parceiros do projeto são: administração regional através dos Serviços Sociais da Junta de Castilla e León que lidera o projeto; quatro administrações locais: municípios de León, Salamanca e Valladolid e a Deputação Provincial de Valladolid (que é o governo local que atende 224 municípios de menos de 20.000 habitantes existentes na demarcação provincial); a European Anti Poverty Network (EAPN) de Castilla e León, como entidade que aglutina e serve de interlocutora de dezenas de entidades do terceiro setor da ação social que operam no território regional; um instituto de investigação, o departamento de Sociologia da Universidade de Valladolid que essencialmente avalia e sistematiza as aprendizagens.

 

Três estratégias do PACT

No projeto PACT experimenta-se a combinação simultânea de três estratégias: rede, modelo de atenção e enfoque populacional.
Na vertente que denominamos por “aliança/rede, trabalha-se no desenvolvimento de uma junção inovadora público-privada (a que chamaremos Rede) dirigida à intervenção multi-agente em situações de exclusão social, incrementando a eficiência e a qualidade do sistema e unificando informação, métodos, recursos e conhecimentos dos agentes públicos e privados no território. O desafio de configuração da Rede implica os seguintes passos: formalização de alianças entre os agentes públicos e privados no âmbito dos serviços sociais e de outros sistemas afetados para, desta forma, garantir o uso mais eficiente dos recursos mediante a promoção de protocolos compartilhados. Devemos ter, ainda, em conta, a delineação dos processos de atenção integral e o desenho e entrada em funcionamento de uma plataforma de informação compartilhada entre os profissionais das organizações públicas e privadas que integram a Rede.
Esta linha de actuação requer trabalhar intensamente em dois aspectos críticos como a criação de uma taxonomia e de uma ontología comuns relacionadas com a intervenção social inclusiva e a articulação de um sistema de informação compartilhada entre agências. Este último elemento supõe um importante desafio tecnológico de interoperabilidade entre os sistemas dos diferentes actores.

 

Modelo de atenção consensual

Trata-se de avançar para maiores cotas de inclusão e para uma menor dependência dos serviços sociais através de um modelo comum de atenção às pessoas em situação ou risco de exclusão, baseado num enfoque apreciativo (não só carencial) e no empoderamento das pessoas (autonomia) como meta final. Ora, este modelo leva-nos aos seguintes desenvolvimentos: desenho e experimentação de uma ferramenta comum de diagnóstico multidimensional da inclusão-exclusão destinada a orientar os planos de caso, isto é, as intervenções profissionais; formação, motivação e compromisso dos profissionais com o novo modelo de atenção; experiência real com casos do modelo de intervenção proposto, levado a cabo por profissionais de diferentes níveis (básico e especializado) e por diferentes instituições (administrações públicas locais e entidades não lucrativas). Ainda, a implementação da figura de gestor ou coordenador de caso (atenção direta) em confluência com outras figuras (de referência e de apoio). Desta forma pesquisa-se quais são os esforços técnicos e os recursos que cada tipologia de caso requer nos diferentes momentos da intervenção.

 

Abordagem populacional (segmentação)

Nesta abordagem tenta perceber-se como é que o sistema pode intervir de maneira proactiva (antes de sucederem estragos nas situações de exclusão e prevenindo as situações de dependência crónica, provocando a perda de autonomia das pessoas).
Trata-se também de otimizar o funcionamento dos serviços sociais dando atenção ajustada a cada caso. É preciso evitar tanto a “sobre intervenção” como a “infra intervenção”. Dar atenção justa a cada caso é um desafio para todos os atores implicados pois é necessário gerar o conhecimento singular de todos os perfis, fatores causais, proporcionando o tratamento adequado e personalizado de cada caso.
A gestão de todo o pacote de informação compartilhada entre todas as instituições (autêntico Big Data) permitirá três coisas: calcular o risco crónico das situações pessoais e familiares através da determinação dos factores críticos presentes em cada circunstância concreta (empregabilidade, tempo de permanência, resiliência, estados vitais, aspetos de convivência, etc.); gerar alertas sobre situações que possam requerer uma intervenção proactiva e/ou intensiva do sistema para prevenir danos, deteriorações ou situações crónicas. Estes alertas dirigem-se aos profissionais da Rede (independentemente da instituição a que pertençam) Por último, permitem gerar uma lista de casos suscetíveis de participar em ações de tipo comunitário.

 

Estratégias combinadas geram inovação

As três estratégias de atuação: aliança-rede; modelo de intervenção e segmentação populacional, distribuídas simultaneamente por quatro territórios piloto, realimentam-se umas às outras de forma a se entrelaçarem nesta experiência, gerando autêntica inovação.

A aliança-Rede é imprescindível para que o modelo de atenção incorpore profissionais e recursos sem sobreposições ou espaços de desatenção e, ainda, para que a segmentação conte com informação e dados suficientes de maneira que os alertas sejam certeiros.

O modelo de intervenção que se propõe, pelo seu carácter multidimensional e integral, alimenta fatores determinantes e de reflexões ontológicas aos algoritmos de segmentação para que se possam realizar seleções, listagens e alertas.
Por outro lado, a atuação integral centrada na pessoa, através do coordenador/gestor de caso, proporciona à aliança-Rede um banco de sinergias e de boas práticas generalizáveis a outros contextos geográficos. Além disso, a intervenção sob um mesmo modelo partilhado entre os profissionais envolvidos favorece a garantia ética da intervenção social.
Finalmente, a segmentação facilita a listagem de casos selecionados por situações similares (não só medindo carências, mas também potencialidades) que possam ser trabalhadas, por grupo, no território, conferindo uma autêntica dimensão comunitária à aliança – Rede.
Além disso, esta atuação, permite oferecer importantes conhecimentos sobre as áreas de sombra ou desatenção que não estejam a ser trabalhadas por nenhum dos agentes, abrindo o espectro de cobertura. A segmentação, adicionalmente, pode oferecer ferramentas imprescindíveis para que o novo modelo de intervenção possa ser aplicado com verdadeira pro-atividade.

 

Organização do projeto

O projecto estrutura-se em sete pacotes de trabalho: direção; aliança-rede; modelo de intervenção; segmentação; pilotagem; avaliação e divulgação.
Optou-se desde o princípio por uma metodologia de alcance (outcome mapping) que ajude a obter e verificar os impactos reais sobre a população destinatária e sobre o sistema de serviços sociais.
As ações iniciais passam, no primeiro ano (nov 2016/ nov 2017)  pelos acordos de Rede,  pelo modelo de intervenção e ontologia para segmentação. Desenvolvido este processo, passa-se à pilotagem, a acontecer no segundo ano do projeto.
A pilotagem consiste na intervenção social direta com 46 casos em cada território (um total de 184) que têm sido selecionados entre beneficiários de rendimentos mínimos, mediante amostragem aleatória (polietápica) no que se consideraram variáveis o tempo de perceção dos rendimentos de inserção.
Em cada território trabalha uma equipe de 12 profissionais dependentes da administração local e de entidades sociais não lucrativas. Cada profissional (apoiado pela equipa) aplica o modelo de intervenção proposto aos seus casos (entre 2 e 5). Na primeira fase do projeto é este o modelo de gestão conseguido através do contributo e da experiência de cerca de 30 profissionais a operarem nos diferentes territórios.
Tudo tem início com a explicação da experiência, a assinatura de uma autorização do participante que aprova a partilha de informação, permitindo a realização de um diagnóstico completo via HDME (ferramenta de diagnóstico multidimensional da exclusão) produto, também, do consenso profissional da primeira etapa do projecto.
Esta ferramenta (comum a todos os operadores) proporciona uma imagem gráfica do estado da situação do participante em diferentes dimensões (económica, laboral,  residencial, sanitária, pessoal e relacional)  permitindo, desta forma, uma abordagem baseada nas potencialidades e não apenas nas carências, permitindo à pessoa uma “radiografia” da sua situação.
Após diagnóstico consensual elabora-se um plano personalizado de caso, onde devem constar todas as ações das instituições envolvidas. Todo o enfoque pretende que a pessoa assuma, progressivamente, o controle da sua própria situação permitindo que tom decisões estratégicas (sobre as dimensões e fatores de intervenção a curto e médio prazo).
Paralelamente está a avançar-se nos sistemas de informação partilhada (taxonomia comum, formulários, atribuição de funções e funcionalidades de software para interoperabilidade). Também se está a compilar informação que permita realizar operações de segmentação e de criação de algoritmos de riscos, caso a caso, que contribuam com informação relevante para os profissionais.
O diagnóstico de risco (por exemplo, o risco de uma situação crónica no que concerne à dependência dos serviços sociais) permite uma abordagem proactiva dos serviços sociais.

 

Futuro imediato

Até julho de 2018 continuaremos a intervenção com os casos que temos em mãos, gerando conhecimento sistematizado sobre estratégias personalizadas em função das situações encontradas.
Estão à prova os mecanismos de coordenação na intervenção ordenada de cada caso e prosseguem os desenvolvimentos das ontologias e das ferramentas partilhadas visando um autêntico funcionamento em rede público-privada, num esforço para que esta atuação seja uma realidade que melhore significativamente.
O projeto tem de estar finalizado em novembro de 2018.
Por enquanto a conclusão mais óbvia é a de que prestar atenção a um sistema integrado de serviços sociais de responsabilidade pública, formado por diferentes instituições profissionais (público-privado) não só é possível, como é imprescindível para avançar. As sinergias geradas, centradas na atenção dada às pessoas em situação de dificuldade (crónica ou recente) empoderando-as bem merecem o investimento.
Estamos muito otimistas.

(1) O conceito de SISTEMA DE SERVIÇOS SOCIAIS DE RESPONSABILIDADE PÚBLICA utiliza-se desde a Lei 16/2010 de serviços sociais de Castilla e León cujo artigo 4.3 integra dentro do sistema conjunto de recursos, programas, actividades, prestações, equipamentos e outras acções de titularidade pública e os de titularidade privada financiados total ou parcialmente com financiamento público.
Setembro 12, 2017
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