>
>
Voluntariado: a vida vivida

Voluntariado: a vida vivida

Professor Associado com Agregação Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas / UTL

Que discurso posso e se pode fazer sobre o voluntariado? Qual a relação entre o voluntariado e o conhecimento, mormente, o científico? E qual ainda a relação entre o voluntariado e a ação política?

A universidade é o lugar da ciência, sua produção, divulgação e apropriação social pela educação. E a ciência é um discurso que se regula pela ‘vontade de saber’ e pela distinção central entre o falso e o verdadeiro. O voluntariado não decorre de todo de uma ‘vontade de saber’ e, portanto, da distinção entre o falso e o verdadeiro. Pode-se referir, por vezes, a expressão ‘fulano é um verdadeiro voluntário’ mas tal expressão nada tem a ver com a noção de verdade científica enquanto desocultamento cognitivo e, portanto, pela confirmação (ou não) empírica de uma hipótese. Podemos, no entanto, ainda argumentar que existem ciências compósitas e aplicadas, como a Medicina, a Gestão, a Arquitectura, o Serviço Social. Mas mesmo nestas a relação com o voluntariado é lateral.

Quanto à ação política, esta regula-se não pela distinção entre verdadeiro e falso mas pela relação, antes de mais, entre poder e impotência. É a ‘vontade de poder’ que explica o discurso e as práticas do político. O voluntariado não decorre, de todo, de uma vontade de poder e, portanto, a relação entre poder e impotência não é o que move o voluntário. É claro que, como em comparação com as ciências aplicadas, também aqui podemos dizer que a Política também pode ser definida como um serviço ao Bem Comum, um serviço à res publica. A referência às ciências aplicadas não é uma mera comparação casuística. O Estado no Ocidente, no século XX, ao tornar-se um Estado Social, tornou-se um Estado gerido por especialistas das tais ciências aplicadas vindos das universidades e em quem se depositou a confiança e a garantia da resolução de problemas.

Saber e Poder juntam-se quando os experts das ciências têm legitimação política. Legitimação essa sustentada pela eficácia social especializada, mais ou menos burocratizada, instrumental e com base na evidência para a identificação, classificação e resolução de problemas.

Quanto ao ‘voluntário’ ele é, antes de mais, aquele que ‘vive e sente’ o voluntariado de forma (diríamos) ‘autêntica’. Não é nem um cientista que confirma hipóteses nem um especialista na resolução de problemas, nem um bureau ou sociocrata. Quer dizer, o voluntariado radica o seu Fazer antes de mais na esfera do Ser e não do Saber ou do Poder. O voluntário define-se, antes de mais, por ‘Estar’ ou ‘Não Estar’ (a disponibilidade). Todos sabemos isso nas organizações de voluntários quando perguntamos: ‘Fulano hoje vem?’ ou dizemos, em tom crítico: ‘Fulano já não aparece há muito tempo!’. O Voluntariado, assim,  relaciona-se acima de tudo com a Vida e não com o Poder ou o Saber. O domínio do Voluntariado é o da Vida Vivida, ou seja da disponibilidade e o da hospitalidade e não propriamente o da vontade de verdade ou o da vontade de poder. Torna-se, então, necessário criar instituições sociais, e antes de mais, económicas, que se baseiem na solidariedade da disponibilidade e da hospitalidade. É esse o desafio das novas gerações!

Abril 9, 2013
Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on email
Share on whatsapp
Campanha
Apoio
Campanha